terça-feira, 14 de outubro de 2008

Águias viram canibais por falta de presas

Algumas águias americanas do Alasca agora estão baseando sua dieta primordialmente em outras aves, de acordo com um novo estudo. A nova dieta é um efeito secundário surpreendente das alteração em uma cadeia alimentar que inclui lontras marinhas, ouriços do mar e florestas de kelp submarino, bem como os peixes que delas dependem, afirmam pesquisadores.

Quando as lontras marinhas praticamente desapareceram das ilhas Aleutas, isso beneficiou muito os ouriços do mar, que constituíam um dos alimentos prediletos das lontras.

A expansão na população de ouriços do mar, por sua vez, começou a reduzir as florestas submarinas de kelp da área. As florestas se reduziram dramaticamente, o tornou as águas costeiras pouco hospitaleiras para os peixes dependentes do kelp como habitação.

Esses peixes, por sua vez, eram a fonte primordial de alimentação das águias americanas. "As lontras marinhas tiveram efeito considerável sobre as comunidades marinhas que vivem perto da costa", disse Robert Anthony, o diretor científico do projeto.

"Os efeitos se fazem sentir ao longo de todo o sistema e afetam indiretamente uma série de espécies, entre as quais as águas americanas "outro predador que se alimenta no topo da cadeia alimentícia".

Até mesmo os pesquisadores estão surpresos por o declínio na população de lontras marinhas ter causado efeitos secundários que afetaram cinco espécies, chegando até às águias americanas, diz Anthony, ecologista do Serviço de Levantamento Geológico dos Estados Unidos e da Universidade Estadual do Oregon.

Dos peixes às aves
Anthony e seus colegas reuniram informações detalhadas sobre as águias americanas das ilhas Aleutas no começo dos anos 90, quando a população de lontras marinhas do arquipélago era relativamente elevada. Os pesquisadores retornaram ao local 10 anos mais tarde, e constataram que a população de lontras marinhas havia reduzido em 90%.

Os pesquisadores contaram o número de casais de águias americanas e estudaram o que as aves vinham comendo. Restos de "jantares" encontrados em ninhos revelam que elas trocaram os peixes e mamíferos - entre os quais filhotes de lontras - por aves.

As águias ainda comem alguns peixes, principalmente de espécies que não dependam de kelp. As águias tinham mais filhotes na segunda visita, possivelmente porque aves oferecem mais calorias do que peixes. A população geral de águias, porém, continuava mais ou menos a mesma, segundo Anthony.

"As mudanças causadas pelo declínio das lontras marinhas pareciam neutras - ou talvez até positivas - para as águias americanas", ele diz. "Trata-se de uma espécie muito adaptável e de um predador oportunista".

Quanto à causa do desaparecimento das lontras, Anthony disse, "não sabemos ao certo mas existe pelo menos uma teoria plausível".

Uma história grande
Os avanços na caça de lontras marinhas por baleias assassinas é a principal causa direta do colapso na população de lontras marinhas das Aleutas nos anos 90, afirma o co-autor do estudo, Jim Estes. Ele lembra, porém, que o estudo em curso trata das conseqüências do colapso na população de lontras, e não de suas causas.

A questão das baleias é sensível por diversos motivos, entre os quais a intriga nacional e internacional que sempre parece cercar as baleias de grande porte.

"Mas, pelo menos em minha opinião, essa é uma história muito maior do que lontras, ouriços do mar, kelp, peixes e águias", disse Jim, que trabalha na Universidade da Califórnia, em Santa Cruz.

A maior parte das baleias assassinas, ou orcas, em geral se alimenta de peixes. Mas alguns grupos caçam outros mamíferos marinhos, e os especialistas em baleias são facilmente capazes de identificar esses grupos, por suas marcas.

As baleias assassinas que se alimentam de mamíferos tradicionalmente tomavam por presas as grandes baleias como espermacetes, baleias corcundas ou baleias comuns, acredita. Mas, pela metade do século 20, a exploração comercial da baleia havia erradicado todas essas fontes de alimento.

O declínio nas populações de grandes baleias levou as orcas a se alimentar de presas cada vez menores - primeiro focas, depois leões - marinhos e agora lontras, afirma Jim.

Número "espantoso" de conexões
Bernie Tershy, da Universidade da Califórnia em Santa Cruz, descreveu o relatório como "interessante e bastante preciso". É "bem aceito", com base em pesquisas anteriores, que as orcas são a causa direta no declínio da população de lontras marinhas das Aleutas, afirmou em mensagem de e-mail o pesquisador, que não participou do estudo.

"O número de conexões alteradas pela mudança na dieta das orcas é espantoso", diz Tershy, que já foi pesquisador da National Geographic Conservation Trust, proprietária da National Geographic.

Holly Jones, doutoranda na Universidade de Yale, havia publicado um relatório alguns meses atrás sobre a ameaça de espécies invasivas de ratos aos pássaros ilhéus. Jones avaliou de maneira mais ampla os possíveis efeitos do novo comportamento das águias na caça.

"Se as águias começarem a exercer impacto dramático sobre as populações de aves marinhas... esses efeitos continuariam a se fazer sentir nos ecossistemas das zonas de maré e em comunidades ilhoas completas", afirmou em e-mail a pesquisadora, que também não participou do estudo.

O estudo sobre a conexão entre as lontras marinhas e os hábitos alimentares das águias "demonstra o quanto os vínculos entre os ecossistemas são importantes, e o quanto eles podem ser frágeis".

Fonte: Terra

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